O fenômeno do Pokémon GO praticamente desapareceu, mas o seu
legado pode ser bem maior do que imaginávamos. Dois professores da
Universidade de Purdue, nos Estados Unidos, tentaram ter uma ideia do
efeito do joguinho em acidentes de trânsito ao estudar dados de um
município de Indiana. Os resultados não são bons para Pikachu e seus
amigos.
Provavelmente não é justo culpar somente um joguinho de celular pelo
aumento de acidentes de trânsito, já que os usuários que decidiram jogar
um game imersivo de realidade aumentada enquanto dirigiam são,
obviamente, culpados. Mas o estudo “Mortes por Pokémon GO“, de Mara Faccio e John J. McConnell, não é sobre encontrar um culpado, mas, sim, recolher dados específicos relacionados ao aumento de acidentes de trânsito que podem estar relacionados a “direção distraída”.
As fatalidades de trânsito pareciam cair ano a ano de forma estável
nos Estados Unidos, desde 1988. De acordo com estatísticas da National
Highway Traffic Safety Administration (NHTSA) – órgão equivalente ao
CONTRAN –, as fatalidades no trânsito dos EUA eram de 42.130 em 1988 e caíram para 29.867
em 2011. Mas aí, as fatalidades e batidas de carro começaram a crescer
novamente. Quando a NHTSA reparou em um aumento de 7,2% nas mortes em
2014, realizou um pedido oficial para que pesquisadores estudassem o que estava acontecendo. O aumento continuou, e, em 2016, o número de fatalidades chegou a 37.461.
A popularização dos smartphones foi identificada como causa primária
para o aumento dos acidentes de trânsito nos últimos anos, mas com
muitos fatores contribuintes possíveis, então é difícil apontar um único
culpado. O estudo de Faccio e McConnell, que ainda não foi revisado
pelos seus pares científicos, tem um método novo para recolher
estatísticas relacionadas, ao fazer uma referência cruzada entre os
dados de acidentes de Tippecanoe County, em Indiana, e compará-los com o
número de “Pokéstops”. Os autores do estudo esperavam descobrir se
havia algum aumento significativo de acidentes nas áreas que estão mais
próximas de onde as pessoas tentavam pegar Pokémon virtuais enquanto
olhavam para os seus celulares.
Os dois pesquisadores reuniram dados de acidentes do município entre os dias 1º de março de 2015 e 30 de novembro de 2016. O Pokémon GO foi lançado no dia 6 de julho de 2016 e alcançou mais de 100 milhões de downloads
até o final daquele mês. A análise dos dados descobriu que os acidentes
aumentaram em todo o país, mas a probabilidade de um acidente acontecer
dentro do raio de 100 metros de uma Pokéstop era 26,5% maior. Diversos
fatores, como intervalos das escolas e flutuações sazonais das
populações, foram levados em consideração na contabilidade do modelo da
pesquisa, e, a cada vez, os dados mostravam um aumento em acidentes em
relação ao ano anterior nos locais que ganharam uma Pokéstop.
No final das contas, o estudo atribui US$ 500 mil em prejuízos nos
veículos que bateram, 31 lesões adicionais e duas mortes a mais em
Tippecanoe County, que parecem estar relacionadas à loucura do Pokémon GO. Além disso, os autores escrevem que “a magnitude da descontinuidade diminui nos meses que se seguem à introdução do Pokémon GO
de forma consistente com a queda no número de jogadores ativos”. Em
outras palavras, quando as pessoas se cansaram do joguinho, os acidentes
de trânsito diminuíram. Então, embora o uso de smartphones seja, no
geral, um fator do problema, o caso de estudo contra o Pokémon,
especificamente, parece ter algum valor.
Quando os números foram estatisticamente aumentados para uma
aplicação em um modelo para todo os Estados Unidos, os resultados
ficaram ainda mais doidos. Os pesquisadores avisam explicitamente que os
dados são “especulativos”, mas concluem que o aumento nacional “das
batidas atribuíveis à introdução de Pokémon GO é de 145.632,
com um aumento associado ao número de feridos em 29.370 e um aumento
associado no número de fatalidades em 256″, em apenas cinco meses. Os
custos econômicos vêm com uma estimativa incrível entre “US$ 2 bilhões a
US$ 7,3 bilhões” dentro do mesmo período de tempo.
Agora, é a vez de legisladores e outros estatísticos determinarem se
esses dados devem ser levados a sério e o que deve ser feito a respeito.
Independentemente disso, o estudo tem um argumento convincente de que o
Pokémon GO teve um efeito significativo nos acidentes de
trânsito. Isso não significa que deveríamos banir o jogo. Os
desenvolvedores já implementaram sistemas que previnem, na maioria das
vezes, que você jogue enquanto dirige.
O estudo também demonstra uma necessidade maior de analisar os impactos financeiros negativos da tecnologia. Só em julho, Pokémon GO rendeu US$ 1,2 bilhão
para os seus distribuidores. Se esse número for verdadeiro, parece que o
jogo teve um impacto econômico negativo, sem mencionar o custo da vida
humana. As análises dos efeitos cascata de empresas de tecnologia na
economia tendem a concentrar-se fortemente no número de empregos
criados. E o governo tende a reagir à tecnologia de acordo com esses
dados de empregos. É só ver a disputa entre alguns líderes que
literalmente injetam dinheiro
na Amazon para convencer Jeff Bezos a construir uma nova sede em sua
cidade. Mesmo que o Pokémon não possa ser responsabilizado por todo esse
dano, vale lembrar que não estamos conseguindo compreender os efeitos
que a inovação tem na sociedade neste momento.
Fonte: Gizmodo