O voo da Juno tem sido tão dramático quanto um thriller de ficção
científica consegue ser. Em outubro passado, o sistema do motor da sonda
teve um mau funcionamento, fazendo com que a NASA atrasasse a abordagem planejada do satélite em uma “órbita da ciência” de 14 dias. Em fevereiro deste
ano, a agência decidiu abrir mão da queima do motor da órbita da
ciência completamente, mantendo a espaçonave em sua órbita muito mais
longa, de 53,5 dias. Mas, nesta quinta-feira (25), finalmente começamos a
receber boas notícias.
A NASA está lançando os primeiros resultados científicos da Juno, em
uma leva de aproximadamente 50 estudos publicados nos periódicos Science e Geophysical Research Letters,
nesta quinta. O plano da missão de estudar o máximo possível Júpiter
conseguiu trazer surpresas onde elas foram alcançáveis. Seja o campo
gravitacional, as auroras ou apenas as temperaturas do gigante de gás, o
planeta é muito mais estranho do que pensávamos.
“É muito mais complexo do que os cientistas estavam presumindo. Esse é
um tema que passa por quase todos os conjuntos de dados que temos”,
disse ao Gizmodo Scott Bolton, do Instituto de Pesquisa Southwest, no
Texas, e investigador principal da Juno. “Um dos resultados mais
empolgantes é essa mudança de paradigma — precisamos repensar como os
planetas gigantes funcionam em geral.”

Imagem: J.E.P. Connerney et al, Science (2017)
A Juno tem um conjunto de instrumentos para medir microondas, ondas
infravermelhas, ondas de rádio, luz visível, o campo magnético de
Júpiter e outras partículas. A órbita alongada da sonda em torno do
planeta lhe permite medições próximas periódicas, feitas durante
passagens “perijove”. Os dados ajudam cientistas a entenderem algumas
das propriedades mais importantes de Júpiter, incluindo o formato de seu
gigantesco campo magnético, como os gases são distribuídos dentro do
planeta e como se movem, quanta água o planeta tem em sua superfície e,
com sorte, a estrutura do planeta até seu núcleo.
As análises mais recentes vêm de apenas uma ou duas das aproximações
da Juno, então é apenas um trecho dos dados totais a serem coletados da
missão (inicialmente, a Juno estava programada para fazer 33 passagens
perijove, mas, após a decisão de manter a sonda em uma órbita mais
larga, esse número foi reduzido). Porém, observações iniciais mostram um
campo gravitacional diferindo das expectativas originais dos
cientistas, polos com várias tempestades agrupadas mais caóticas que as
de Saturno, um campo magnético duas vezes mais forte que o esperado e um
louco processo de geração de auroras, provavelmente bem diferente
daquele da Terra.
É importante apontar que uma ou duas passagens não estão sequer
próximas de serem suficientes para se tirar tantas conclusões marcantes,
a não ser a de que “Júpiter é estranho”. “É como se você quisesse
entender o centro da Terra, presumisse que não fosse majoritariamente
simétrico e tudo que você fizesse fosse sobrevoar a Flórida e Nova
York”, disse Bolton. “Você não conseguiria saber como seriam as coisas
sobre a Califórnia, a África ou a Europa.”

Imagem: NASA / SwRI / MSSS / Gerald Eichstädt / Seán Doran © DOMÍNIO PÚBLICO
Além das limitações à órbita da sonda e das mudanças na missão em si,
maioria das pessoas com quem falei achou que os instrumentos da Juno —
os melhores já enviados a Júpiter para estudar o planeta — superava suas
limitações. “Estamos conseguindo dados melhores do que jamais
conseguimos”, disse ao Gizmodo Kimberly Moore, estudante de
pós-graduação de Harvard. “A questão não é quais são nossos limites, mas
o quão melhores nossos resultados são.”
E se tem alguém que sabe quais são as melhorias tecnológicas da Juno,
esse alguém é Bill Kurth, da Universidade de Iowa. Kurth estudou ondas
de rádio com a missão Voyager, há quase 40 anos. Agora, está trabalhando
em observações de ondas de rádio e plasma para a Juno. Os novos
instrumentos permitiram a Kurth e outros cientistas fazer algo que os
cientistas da Voyager não conseguiram: voar exatamente através de
algumas das emissões de rádio mais intensas do sistema solar, emanando
de Júpiter. “Acho que o programa Voyager nos permitiu anotar as questões
que poderíamos responder com essas missões seguintes”, disse Kurth.
Mark Hofstadter, cientista planetário do Laboratório de Propulsão a
Jato da NASA, participou apenas do processo de proposição e, meio que
como uma fonte de fora, sentiu que esses primeiros resultados foram “um
belo exemplo de como a ciência frequentemente funciona”. Teóricos criam
todos os tipos de modelos para tentar explicar os dados, e cientistas
tendem a favorecer os mais simples. Mas esses modelos frequentemente não
estão exatamente certos. Agora que observadores de fato coletaram
dados, os teóricos precisam voltar uma casa e tentar descobrir o que
diabos está acontecendo.

Imagem: J.E.P. Connerney et al, Science (2017)
Hofstadter ficou especialmente empolgado com os padrões climáticos
que parecem ir bem a fundo, várias centenas de quilômetros abaixo da
superfície de Júpiter. Claro, vemos tempestades furiosas na superfície,
mas parece haver ainda mais complexidade abaixo.
Os pesquisadores não pareceram muito desapontados com as órbitas mais
longas que o esperado, já que elas dão ao pessoal mais tempo de fazer
sua ciência, disse ao Gizmodo Randy Gladstone, outro físico do Instituto
de Pesquisa Southwest. Ele apontou, sim, que o novo alinhamento da
sonda será complicado de se lidar — deveria orbitar em torno da região
de crepúsculo entre o amanhecer e a fase mais escura do crepúsculo, mas
agora vivencia períodos de sol e escuridão plenos. Essas não são as
condições nas quais os instrumentos foram construídos para operar.
Também será mais difícil lidar com a maior exposição à luz solar
enquanto se tenta observar a aurora do planeta.
Por fim, os pesquisadores esperam entender não apenas o maior planeta do sistema solar, mas como os planetas se formam em geral.
Coisas como a abundância de cada elemento em Júpiter podem ajudar os
cientistas a afunilar suas teorias sobre outros gigantes de gás, disse
Bolton. “Mas você não vai conseguir testar essas previsões até que possa
enviar missões a esses planetas também.”
Se você está empolgado com a missão Juno, pode ajudar a votar
para onde a JunoCam deverá ser apontada durante a passagem perijove.
Após novas imagens serem registradas, elas são colocadas online, onde as
pessoas com o software certo conseguem processá-las e criar
umas imagens bem incríveis.
E se você está se perguntando sobre qual o cheiro do planeta, “ele
teria um cheiro de amônia mais forte do Urano ou Netuno”, disse
Hofstadter.
Fonte: Gizmodo