A vida vem transformando a atmosfera da Terra desde que os primeiros
organismos unicelulares evoluíram. Mas poucos casos de terraformação
atmosférica se comparam com o que aconteceu há 2,7 bilhões de anos,
quando a pressão do ar parece ter caído para menos da metade do seu
valor atual. O que poderia ter causado tamanha despressurização no
mundo? De acordo com uma nova hipótese, os culpados são micróbios famintos por nitrogênio.
Cientistas por muito tempo acreditavam que nosso planeta tinha uma
atmosfera muito mais espessa em um passado distante. Este pressuposto
vem da observação de que a Terra tinha oceanos líquidos há quatro
bilhões de anos, quando o Sol tinha apenas 70% do brilho que tem hoje.
Para compensar o sol fraco, uma atmosfera espessa e rica em gases do
efeito estufa poderiam impedir o mundo de congelar completamente.
Mas a Terra antiga também era um lugar volátil, sujeito a mudanças
bruscas na química atmosférica e no clima. Um novo estudo liderado por
Sanjoy Som, da Universidade de Washington, indica que em um momento da
nossa história nosso planeta tinha muito menos ar, e que um grande
evento biológico pode ter sido o responsável por isso.
Escrevendo na Nature Geoscience,
Som e seus colegas descreveram os resultados de uma análise de bolhas
de ar presas encontradas dentro de um fluxo de lava de 2,7 bilhões de
anos no Rio Beasley, no oeste da Austrália. Usando varredura raio-X de
alta precisão, a equipe conseguiu medir a diminuição no tamanho das
bolhas de ar entre o topo e a parte mais baixa da camada de lava. Esta
mudança de tamanho corresponde à pressão exercida pela atmosfera antiga
da Terra conforme a lava resfriava.
A análise deles revelou que a pressão atmosférica há 2,7 bilhões de
anos era quase a metade do valor atual – um resultado dá um tapa na cara
do nosso entendimento da Terra durante o período Arqueano.
Agora os cientistas precisam descobrir o que isso significa. Se os
resultados forem corroborados por outras evidências geológicas, podem
sugerir que alguma coisa enorme aconteceu há cerca de três bilhões de
anos que reduziu o tamanho da atmosfera. E Som tem um palpite sobre o
que pode ter sido isso.
Outras evidências geoquímicas sugerem que cerca de 3,2 bilhões de
anos atrás, bactérias desenvolveram mecanismos para transformar
nitrogênio atmosférico (gás N2) em amônia (NH3), uma forma
biologicamente útil. Este processo, conhecido como fixação de
nitrogênio, foi essencial para a evolução da vida complexa. Sem ele,
plantas e animais não teriam nenhuma forma de acessar o nitrogênio que
nossas células precisam para construir proteínas e DNA.
Essencialmente, Som e seus colegas suspeitam que a capacidade de
minerar a atmosfera por nitrogênio fez a pressão do ar cair
vertiginosamente. Alguns milhões de anos depois, o sistema se recuperou
quando outros processos metabólicos começaram a lançar nitrogênio de
volta à atmosfera.
Os pesquisadores enfatizam que isso é só uma hipótese – uma que é
apoiada por um resultado surpreendente. Se estiver correta, as
implicações vão muito além de satisfazer nossa curiosidade sobre o
passado do nosso planeta – ela pode nos ajudar a encontrar vida em
outros mundos.
Ao construir uma imagem precisa dos gases presentes na nossa
atmosfera quando a vida estava começando, vamos ter uma chance de
detectar as assinaturas de vida no ar de exoplanetas distantes. Se a
pressão do ar na Terra há três bilhões de anos era muito menor do que
pensávamos, então talvez a superfície tenha sido mantida quente por uma
concentração alta de gases potenciais do efeito estufa como o metano.
Então, em nome dos possíveis alienígenas do universo, vamos torcer
para que os geólogos descubram como diabos eram as bactérias devoradoras
de nitrogênio da Terra. E para nosso bem, vamos agradecer o fato de que
as coisas se acalmaram com o passar do tempo.